O encolhimento do imigrante
19 abr 2022
Parece contraditório falar sobre o encolhimento do imigrante quando ele chega em um novo país pra expandir.
Nos quase 4 anos em que moro em Nova York, conheci muitas pessoas, especialmente mulheres e LGBTQ+, que vieram do Brasil para os Estados Unidos em busca de uma qualidade de vida melhor.
Cada um tem sua própria definição de “qualidade de vida”, mas melhorar é um pouco sinônimo de mudar. Se não fosse assim, continuaria tudo igual e estava muito bom, mas não é o caso.
Muitos imigrantes vêm pros Estados Unidos atrás de uma vida melhor
Eu não sei se a gente não pensa direito – eu não pensei e, sinceramente, não acho que tenha como mensurar o tamanho da mudança antes de, de fato, embarcar no avião e mudar.
A verdade é que novas oportunidades são almejadas com o filtro da arrogância de quem pensa que conhece o futuro. É muito difícil prever os desafios de uma cidade nova, mesmo que você a conheça bem.
No livro que vou lançar, conto que quando mudei para São Paulo, me senti engolida. Minha arrogância me fez acreditar que SP era o quintal da minha casa. Mas a cidade é gigantesca e não caberia nos meus sonhos mais ousados.
Ninguém conhece todos os segredos de onde vive
Eu acho que é assim em todo lugar. Ninguém conhece todos os segredos de si, imagina dos lugares onde vive.
Sei de pessoas que trabalhavam online antes de chegar aqui e sentiram dificuldade na adaptação profissional, pessoas que vieram transferidas, filhos de americanos e “locais” que não acharam a mudança um passeio no parque.
A verdade é que “expandir”, pra maioria dos imigrantes, é sobre ter mais mais acessos culturais, financeiros, profissionais e intelectuais. Só que essa expansão tem um custo alto – quase opressor.
Deixar a própria pátria significa ser confrontado, todos os dias, com desafios inimagináveis, vocabulários incompreensíveis, costumes que você não tem, comidas que você não acha… Mudar para outro país é imergir numa cultura que você só conhecia através das lentes do cinema ou da memória.
O imigrante acuado retrai diante dos desafios
Todas essas facetas, ao invés de expandir a mente de quem chega, retrai. É doloroso reaprender a viver depois de ter uma vida estabelecida. (Re) aprender sacode sua base, autoconfiança, autoestima, a segurança que você tem em si. Assimilar uma nova cultura faz você questionar tudo que faz de você, você.
O encolhimento do imigrante chega para quase todos. Conheci pessoas, com as mais variadas certificações sociais, encolhendo. Eu vi eles se apagando. Eu me vi apagar.
Presenciei pessoas questionando valores estabelecidos e chacoalhando fundações cravadas. A palavra “expansão” vem acompanhada de muitos pormenores, que também podemos chamar de pedágios. E o preço que se paga para ter uma vida melhor é o tempo que se leva pra limpar tudo em você que não é seu, se recuperar e, finalmente, expandir.
Vi tudo isso em menos de 4 anos. Durante esse tempo, eu me tornava uma imigrante externa e interna. Se você quiser fazer essa jornada pra fugir de alguma coisa: “be my guest”. Não posso dizer que não fiz o mesmo.
Como despedida, deixo uma reflexão: mudar de país é como mergulhar em uma imagem.